Um mega protesto acontecido em uma comunidade em Olinda, Pernambuco, na tarde da abertura da Bienal do Livro, bem ilustra que se pode atravessar fronteiras, sem saber, indo e voltando de uma área específica, para outra. Motoristas serpenteavam por Olinda e Recife (desconhecendo, às vezes, a cidade onde se encontravam), para fugir de bloqueios, de pneus pegando fogo, de bombas caseiras sendo lançadas.
Nebulosa, dessa mesma forma, é a divisa entre o errado e o certo. A faixa divisória se espicha, se encurta, se alarga. Todos podem estar descumprindo alguma norma, ainda que não saiba que o faz.
O mais forte exemplo do regramento social, a lei, se afigura um cipoal gigantesco, decorrente de uma fúria legiferante dos parlamentares só faz crescer cada vez mais. Só em 2019 havia mais de 790 mil normas. Se não é possível determinar o número exato de leis existentes no Brasil, impossível é a missão de conhecer o teor de todas essas normas. Essas regras podem incluir também os costumes, conforme o artigo113, do Código Civil.
Destarte, é irônico que “ninguém se escusa de descumprir a lei alegando que não a conhece”. Quando se fala em boa-fé e má-fé, a dificuldade aumenta sinistramente. Há quem, errando por caminhos diferentes, sente-se certo do que está fazendo.
Inúmeros crimes ficam impunes com o fundamento de que, se o cumprimento da lei causar mais danos, justifica-se o ato, e o princípio da legalidade não prevalece sobre o da “proporcionalidade”.
Todo mundo é bom e é mau, em diferentes medidas, dependendo das circunstâncias. Em Olinda, os transtornos acarretados pelos mencionados protestos estão sendo usados como motivo para tudo o que é necessário dar explicações, inclusive em relação a problemas preexistentes a essas manifestações.
Os olhos sempre bem atentos e abertos merecem possibilitar um olhar crítico, mesmo diante de fatos que pareçam divertidos e engraçados. Só mesmo a intuição, a esperança, a criatividade, podem oferecer algum conhecimento sobre as regras do jogo. Quem conhece as regras, aprende a jogar com elas.
*André Luiz Nakamura é advogado, tem mais de duas décadas de experiência no
serviço público e é autor da trilogia literária “Espíritos Vadios”.





