Ninguém deixa o conforto de casa para enfrentar carro, ônibus, aviões, barcos, hotéis de quinta, restaurantes de terceira, comida ruim e água contaminada apenas para relaxar, tirar do corpo o estresse e ver coisas diferentes. Como escolho uma bela viagem se o preço do dólar e do euro estão pela hora da morte?
Não viaje pensando nas informações dos seus amigos andarilhos. Seja egoísta, vá aberto às suas percepções. Elas serão únicas. Não importando se boas ou más, serão apenas suas. Por isso, não tenha medo delas. Aquela comida lá no Marrocos, ninguém do grupo gostou, mas você amou. Seja egoísta, não conte. Seja covarde se não tiver coragem de gritar: “gostei, amei, quero repetir a experiência”.
Aquele prato típico, com aquele gosto misturado de cominho, cúrcuma, gengibre, páprica e açafrão, pior, aquele gostinho de canela, isso me fez lembrar alguma coisa… Canela, seria o arroz doce da sua avó?
Lembre-se, o Marrocos fica na África, perto da Espanha (como assim?), por onde se chega através do Estreito de Gibraltar. Isso te diz alguma coisa?
Seus ancestrais eram espanhóis? Vieram para Brasil e foram conviver com os “brasileiros” do Sudeste e aí descobriram um espanhol fantástico chamado Padre José de Anchieta, um dos fundadores de São Paulo e Rio de Janeiro? Ele foi o primeiro dramaturgo, o primeiro gramático e o primeiro poeta, nascido nas Ilhas Canárias, além do primeiro autor da gramática de língua tupi. Ele é conhecido como o “Apóstolo do Brasil”, faz parte da Academia Brasileira de Música. Foram os jesuítas que trouxeram a canela para o Brasil.
Certo. Desculpe. Você nada tem a ver com espanhóis. Quem sabe Sri Lanka, Índia e outros países do sudoeste asiático?
Ok. Esqueçamos a canela.
Você quer vir para uma praia, paradisíaca. Que tal a Grécia? Não se preocupe com a comida. O pai da medicina, Hipócrates (não confunda, Hipócritas é outra coisa) viveu no país, nasceu na ilha de Kós (Cós) e dizia que o alimento deveria ser o nosso remédio.
Não vá às praias, eleitas por modismos. Procure as tradicionais, Mikonos, Santorini e Creta talvez não estejam tão “atualizadas”, mas você saiu de Nova Iorque para ir para Nova Iorque? Veja o novo no velho, sinta-se em casa, não seja apenas mais um.
Não viaje correndo para poder descansar, aproveite a viagem. Abra os cinco sentidos e, se for necessário, o sexto também. E quando os gregos te convidarem para ir à cozinha ver a elaboração dos pratos e para experimentar Moussaka e Risogalo, tenha certeza, você vai voltar para os braços da vovó, você estará na sua casa. A canela sempre será nossa companheira de jornada. Na Grécia, ela faz parte dos pratos doces e salgados.
Viajar é abraçar a Terra em que vivemos, é conhecer, compreender e amar nossos irmãos com todas as nossas diferenças e semelhanças.
Viaje sempre que puder, meu bom amigo, seu corpo vai se estressar, mas sua alma vai explodir de alegria. Dizem que é ela e somente ela que você levará consigo, quando esticar a canela.
*Rosário Maiettini é jornalista e autora do livro
“Volta ao mundo em 280 páginas – Do crepúsculo ao alvorecer”





