No varejo, ainda há uma crença confortável: enquanto o cliente não reclama, está tudo bem. É um equívoco que custa milhões. O cliente que não reclama não está satisfeito, está desistindo. E a desistência silenciosa é hoje o maior ponto cego das empresas.
Dados de mercado mostram que mais de 70% dos consumidores que abandonam uma marca nunca registraram qualquer insatisfação formal. Eles não enviam e-mail, não acionam o SAC e não respondem pesquisas. Apenas deixam de comprar. Essa evasão invisível é mais cara do que qualquer problema explícito, porque rompe o relacionamento sem oferecer à empresa a chance de correção.
A raiz do fenômeno é conhecida, mas pouco enfrentada: experiências genéricas, comunicação descontextualizada e baixa capacidade das marcas de interpretar sinais sutis de desengajamento. No Brasil, onde grande parte do varejo ainda opera com dados fragmentados, o silêncio do consumidor não é percebido como sintoma, é tratado como ausência de problema.
O que pesquisas recentes mostram é exatamente o contrário. Mudanças micro comportamentais, como aumento do intervalo entre compras, queda gradual do ticket ou abandono de carrinhos, antecedem a ruptura definitiva. São sinais objetivos de desgaste emocional e funcional com a marca. Ignorá-los é perder a oportunidade de intervir antes que a relação se desfaça.
Aqui, o CRM deixa de ser ferramenta e assume papel de diagnóstico cultural. Marcas que conseguem unificar dados, construir visão longitudinal do cliente e personalizar interações por contexto, não por volume, aumentam significativamente as taxas de retenção. Mais do que realizar campanhas, tratam o relacionamento como ativo financeiro.
O varejo que ainda reage apenas ao cliente “vocal” vive atrasado no tempo. O novo consumidor é híbrido, hiperconectado e pouco tolerante ao atrito. Quando se cala, não está poupando a marca; está sinalizando que encontrou outra que o entende melhor.
Prevenir o silêncio é, portanto, uma obrigação estratégica. Envolve leitura de dados, integração entre canais, coerência de comunicação e respeito ao histórico do cliente. Reclamação é oportunidade, silêncio é ruptura. E num mercado em que a fidelidade é volátil, ouvir antes do barulho é a única forma de não transformar o cliente calado no início de uma perda anunciada.
*Autora de “CRM no varejo: do Seu Zé à era das IAs”, Jholy Mello é
estrategista com mais de 15 anos de experiência em marketing,
design, CRM no varejo e projetos que cruzam dados, criatividade e tecnologia





