Com a popularização dos modelos de Inteligência Artificial (IA) Generativa, como o ChatGPT, as pessoas passaram a ter acesso a uma vasta gama de conhecimento sintetizado. Tarefas como sumarização de textos, tradução, resolução de problemas matemáticos e geração de imagens foram simplificadas ao ato de digitar palavras e apertar “enter”.
Esses modelos generativos passaram, inclusive, a permitir que qualquer pessoa crie peças de arte. Por exemplo, ao solicitar “Tigres voadores no estilo de Tarsila do Amaral” a uma IA, uma imagem dos animais alados imitando a arte da artista é exibida em segundos. Então, será que a IA tornará os artistas uma espécie em extinção?
Um ponto a se considerar é que esses modelos generativos não existem sem os artistas reais. Todo texto ou imagem gerado artificialmente se baseia nos milhões de exemplos usados em seu treinamento. Nada é criado “do zero”. Se o modelo sabe emular a escrita de Shakespeare, é porque ele teve acesso aos textos do poeta. Além disso, estudos mostram que modelos sucessivamente treinados com conteúdo gerado por IA tendem a produzir resultados menos diversos. Por isso, a originalidade dos artistas continua crucial para os modelos terem bons resultados.
E isso leva a outro ponto desse debate: direitos autorais. As bases de dados usadas para treinar os modelos generativos incluem material encontrado publicamente na internet e em outras fontes. Mas aparentemente material proprietário está sendo utilizado sem consentimento, como no caso da escritora Sarah Silverman, que abriu processo contra a OpenAI, criadora do ChatGPT, e a Meta (Facebook). Ela alega que seus textos foram obtidos de forma ilegal e usados sem seu consentimento, o que configuraria violação da lei de propriedade intelectual.
É crescente o movimento de artistas contra o uso de suas obras em treinamento de modelos de IA. Após protestos, a Stability AI, criadora do Stable Diffusion, permitiu que artistas optassem por não ter suas obras utilizadas na versão mais recente da ferramenta; isso removeu 80 milhões de imagens da base. Por um lado, reduz a diversidade da IA, mas, por outro, é um movimento positivo em direção ao consentimento e justa compensação pelo trabalho dos artistas. Esse embate traz à tona a necessidade de uma revisão das leis, afinal, empresas estão faturando milhões de dólares com o trabalho de pessoas que não recebem um centavo em retorno.
Por fim, os modelos generativos apenas replicam o que aprenderam. Não há processo de criação, muito menos uma mensagem ou um posicionamento do artista por trás da obra. É somente matemática. Até o dia em que a IA gere mentes (ou almas) genuinamente parecidas com a humana, nossos artistas terão um longo reinado criativo pela frente.
*Gabriel Rosario é head de dados, mestre em Ciência da
Computação pela UFRJ e especialista em Inteligência Artificial.
Também é autor do sci-fi Rapina: Não confie em androides