A proposta, ainda em estudo, do Ministério da Educação (MEC) de proibir o uso de celulares nas escolas parece, à primeira vista, uma solução direta para combater distrações e melhorar o desempenho acadêmico. No entanto, existe um perigo de que essa medida possa acabar sendo apresentada como uma resposta simplista para um problema que é, na verdade, muito mais profundo e cultural. Sem um apoio logístico adequado para escolas e um projeto pedagógico robusto de conscientização sobre bem-estar digital, essa tentativa de controle corre o risco de ter efeitos limitados e enfrentar resistência tanto de alunos quanto de parte das famílias.
A UNESCO revelou que um em cada quatro países já implementou leis ou políticas de restrição ao uso de celulares nas escolas. Países como França, Itália, Espanha, Austrália e China possuem legislações que proíbem ou limitam esse uso. A França, por exemplo, baniu os celulares nas escolas desde 2018 com o intuito de reduzir distrações em sala de aula, enquanto o Reino Unido anunciou diretrizes similares em 2023. Embora essas políticas sejam amplamente adotadas, sua implementação varia e enfrenta desafios locais, especialmente na fiscalização.
Enquanto alguns estudos sugerem um aumento nas notas de estudantes após o banimento, especialmente entre alunos com dificuldades, a pesquisa ainda é inconclusiva. Uma revisão de estudos globais, publicada neste ano, analisou mais de 22 artigos e descobriu que, embora o impacto positivo nos resultados acadêmicos seja real em alguns casos, os resultados variam. Em muitos países, não houve melhorias significativas, e alguns alunos relataram maior ansiedade quando privados de seus celulares, especialmente após o isolamento social da pandemia.
A implementação dessas políticas também não é simples. Embora pareça fácil anunciar um banimento, mudar práticas escolares é muito mais desafiador. Além disso, há o risco de que apenas proibir celulares nas escolas possa não preparar os estudantes para adotar comportamentos digitais mais responsáveis.
As restrições e o banimento do uso de celulares durante o horário escolar podem, sim, ser benéficos, dependendo do contexto. Porém, é importante lembrar que a vida da criança não se limita ao ambiente escolar. Problemas como o cyberbullying, por exemplo, costumam ocorrer fora dos muros das escolas, em momentos de interação online. Por isso, a melhor solução, a longo prazo, é a conscientização tanto dos alunos quanto das famílias sobre o uso responsável da tecnologia.
Promover o diálogo e educar sobre hábitos digitais saudáveis ajudam a desenvolver autonomia e senso de responsabilidade, criando uma cultura de bem-estar digital que ultrapassa os limites da sala de aula. Afinal, aprender a gerenciar a tecnologia de forma equilibrada é uma habilidade essencial para a vida toda.
*Fernando Lino é pesquisador, neuroeducador e autor do livro “Bem-estar Digital”.
Mestre em Educação Tecnológica e Membro da Associação Internacional de
Educação Neurodesenvolvimental, é fundador do Guardião Digital, projeto que
promove bem-estar virtual nas escolas brasileiras.